Uma
vez, há muito tempo, eu ouvi falar sobre as pessoas que têm sonhos. Disseram-me
que são fascinantemente belas, disseram-me que seus olhos têm um brilho
diferente. Talvez os sonhos deixem-nas mais vivas, ou talvez, os sonhos sejam a
própria vida. Ouvi dizer também, que uma vez ou outra, elas se perdem de seus
sonhos e cegamente percorrem caminhos tortos.
Talvez
pelo fato de se acharem adultas, algumas delas, julgando-se até amadurecidas,
acreditam-se crescidas demais para continuarem a acreditar em contos de fadas. Costumam
chamar essas pessoas de “pessoas realistas”. Eu as chamo de “pessoas que
perderam a fé”.
Jostein
Gaarder nos disse em uma de suas obras, que quando chegamos ao mundo, somos como se
estivéssemos nas pontas dos pelos de um coelho e, estando nas pontas dos pelos,
tudo é novo; surpreendemo-nos com o que vemos, queremos tocar, chegar mais
perto; queremos conhecer o novo e somos totalmente abertos às possibilidades.
Então começamos a crescer e crescendo, o peso da realidade nos faz escorregar
para o fundo da pelagem, construindo lá embaixo o que de certa forma, Gaarder
chama de “cama do comodismo”... Outras pessoas vêm a chamar esse processo de
construção da cama na pelugem macia de “manter-se com os pés no chão”, o que
seria na verdade, deixar de se encantar com as coisas simples; não esperar que
flores brotem no asfalto... Talvez isso explique de que forma morrem os sonhos, ou talvez não
explique nada, porque nada é certo.
Fazendo
uma análise da metáfora de Gaarder, chegamos à conclusão de que basicamente,
quando deixamos os sonhos e começamos a percorrer os caminhos que achamos
certos, estamos na verdade, percorrendo caminhos tortos que em nossas medíocres
reflexões, julgamos serem os caminhos da racionalidade.
Do
ponto de vista de alguém que ainda tem alguns sonhos loucos; de alguém que em
sua meninice, ainda encontra algum sentido nos contos de fadas, digo-vos que,
acreditar no que a maioria acredita ser impossível, é reconfortante diante de
uma realidade pintada em tons de cinza...
Que
aquele que se encontra nas pontas dos pelos do coelho, não desça; que o que já
está descendo, torne a subir e que o que jaz acomodado na pelugem quentinha,
apresse-se em ascender. Corra! Volte de pressa para os sonhos bobos que
deixaste. Reencontre-se e encontre em si e nas coisas simples, o que a maioria
dos homens morrem buscando... A felicidade.
"Uilton David Santos"